segunda-feira, 18 de maio de 2009

A invisível e o boêmio

Eram 8:10 de uma manhã de novembro. A chuva parecia cair horizontalmente e de nada adiantava aquele guarda chuva azul com pequenas flores em tons de rosa e roxo. As gotas que caíam pareciam querer cortar a sua pele, com as roupas molhadas a invisível projetava no chão passos trêmulos de frio.
Nos fones os acordes pareciam sussurrar alguma coisa sobre a velocidade do som e passavam de certo modo uma estranha sensação de esperança e um frio na barriga. A invisível adorava e odiava essa sensação.

Na verdade (com essa sensação) ela queria apenas correr, correr pra bem longe, correr até cansar, correr até desmaiar, correr até chegar num beco sem saída que significaria a escolha entre pular ou não e que significado intenso tinha aquela vontade que somente ela sabia o que era.
De longe desenhava-se no espaço um vulto que cambaleava de leve, não parecia se importar com as pequenas navalhas que tentavam dilacerar. A calça azul marinho movia-se desmanchando as pregas lentamente, na camisa preta alguns botões abertos e um que se perdera no caminho, provavelmente caiu quando uma das mulheres acendia seu cigarro e a outra o puxava para trás. O chapéu cobria os cachos negros do boêmio que tinha um caminhar ímpar.

Os corpos antes distantes agora delineavam-se perfeitamente, a invisível hipnotizada pelo boêmio, que não devia passar dos 22, não conseguia desviar a atenção daquela figura tão intrigante e sedutora. Não mais que três segundos depois, o boêmio levou seu cigarro apagado à boca e observava a pequena que andava do outro lado da rua fitando-o, deu um sorriso de canto de boca.

A garota queimou por dentro apesar do frio cortante, um olhar, um boêmio e um sorriso. Foi tão inesperado que o mundo calou, ela parou, o chão sumiu e tudo parecia estar em queda livre sem ao menos sair do lugar e enquanto o boêmio a encarava mostrando aquele sorriso frouxo ela não se sentiu invisível pela primeira vez. Podia sentir o calor do olhar daquele homem que continuava a andar levando seus pés preguiçosos por caminhos inundados.

Sem fala, a garota que permanecia ali parada com o guarda chuva aos pés se sentiu tão feliz que nem percebeu que a chuva encharcara por completo e foi assim que por alguns segundos a invisível foi vista por alguém.



Minus celcius - Backyard babies

3 comentários:

Noctámbulo Desesperado disse...

Es....exquisito

Comentador Fiel disse...

Run, Invisible, Run!

quem sabe um dia ache o que está procurando ou fuja do que a incomoda.

vai saber

Eduardo Silva disse...

Bem, andava por aí com a insônia de todo dia (ou noite) e acabei encontrando esse belo texto... ainda continuo insone, mas quando conseguir dormir,quem sabe só na próxima semana, será leve, flutuante, inebriante... assim como seu post. Não vou te parabenizar. Vou te agradecer. Obrigado. Beijo, Edu